É tempo de calmaria
Quando o tempo desacelera, a vida pode se revelar ainda mais mágica e única
Ontem separei alguns temas que achei interessante dividir por aqui. Ao final da breve lista, percebi que algo essencial faltava.
Não teria muito a ver com o surf, mas comigo. Antes de ser surfista, viajar em busca de ondas, vestir neoprene e usar gírias dessa tribo — fui e sou outras “coisas”.
Nasci em São Bernardo do Campo, dia 30 de maio de 1983. Segundo minha família, era um dia frio. O horário é incerto, não me lembro. Não sei se foi à meia-noite ou às 2h da manhã. Não tenho certidão de nascimento desde que minha mãe destruiu meus registros — incluindo documentos, diplomas e fotografias.
Esse fato me fez questionar minha identidade. Afinal, duas horas fazem diferença no mapa astrológico. Posso ser geminiana com ascendente em Áries ou em Peixes. Para quem acredita no poder dos astros, como eu — mas não vive em função disso — faz certa diferença.
Uma amiga sugeriu que eu escolhesse o que fizesse mais sentido. Talvez numa tentativa de amenizar a dor ou simplesmente descontrair um papo meio brabo. Mas, antes que se pergunte, não guardo mágoa da minha mãe. Sinto muito, claro, mas entendo que ela estava em profundo sofrimento psíquico. E, entre tantas coisas sem sentido que fez antes de morrer, essa talvez tenha sido a mais banal.
Na última terça-feira, quando tive um encontro próximo com a morte — ou, pelo menos, com um acidente grave — essa história de vida tomou conta de mim.
Estava a caminho de São Paulo. Saí de Ubatuba às 19h e, em duas horas, já estava na rodovia Carvalho Pinto. Assustei com a rapidez com que havia chegado ali, mesmo com a neblina da serra de Taubaté, e me perguntei: “Estou com pressa de quê?”
Imediatamente desacelerei. Lembrei dos perigos da estrada, especialmente à noite, e pensei num primo distante que morreu ao se chocar com um animal na pista. Em seguida, minha mente reproduziu a imagem de um cavalo — era grande e marrom. Após minutos, ou menos que isso, um cavalo de carne e osso atravessava meu caminho.
Na pista da esquerda, no escuro, não deu tempo de nada. Fechei os olhos por instinto, eu acho, e esperei a batida. Ouvi o barulho da porrada. O carro, do meu lado, na pista do meio, acertou o animal em cheio. Entrei em pânico.
Não consegui parar o carro e tudo que fazia era chorar, e recuperar alguma força na perna que mantivesse o acelerador pressionado.
Cheguei a São Paulo transtornada. Entrei em pânico duas vezes: primeiro, quando vi o animal na pista e o carro ao lado se chocando com ele; depois, quando percebi que não parei para prestar socorro. Vi que os carros que vinham atrás pararam, e isso me deu certo alívio na hora — mas depois, não. Me perguntava se eu poderia ter feito algo, mesmo imaginando que, daquele acidente, haveria pouca chance de sobreviventes.
Às 17h da quarta-feira, liguei para o serviço de emergência que administra a rodovia. Foi quando finalmente voltei a ser quem sou. “O rapaz do carro saiu ileso”, o funcionário disse. O animal, não. Senti pena pelo cavalo. Consigo me lembrar dos olhos dele — pareciam tristes e desnorteados naquela pista. Ele era bege, e não marrom como havia visto minutos antes. Me perguntava como era possível eu ter visto um cavalo.
Escrevi um bocado sobre a situação pra me ajudar a não transformar tudo em um trauma. Contei pra poucas pessoas, para evitar que fosse um assunto falado em vão. Rezei e agradeci muito a minha mãe, quem eu acredito que me protege desde que deixou esse mundo.
Depois disso, voltei a pensar com frequência nas coisas que tiram meu sossego, em como tenho sido exigente demais comigo. Decidi tirar o pé do acelerador e da ânsia de produzir.
Serei mais atenta ao tempo, pois fui presenteada com mais tempo — esse bem tão precioso.
E desejo que você faça o mesmo: desacelere, respire e admire as coisas mais simples da vida. Como o sorriso de um filho, de um sobrinhho, uma onda quebrando, um mergulho no mar, o ócio. O sal e o sol no rosto. Os pés na areia e uma boa sombra fresca…
E por falar em tempo...
Tatiana Weston-Webb anunciou que vai dar um tempo do CT. A surfista declarou nas redes sociais que a decisão foi difícil, porém necessária, já que ela e os profissionais que a acompanham previam um burnout.
Na declaração, além de salientar a importância de cuidar da saúde mental, ela falou sobre o tempo e o ritmo que guiam a vida:
“A pausa não é um fim, mas um recomeço. Sei que, com o apoio de todos, voltarei ao mar mais forte, mais consciente e mais apaixonada do que nunca.”
A próxima parada do CT é El Salvador. E se você é como eu, e adora acompanhar uma etapa, trago boas notícias: o evento tem tudo para começar amanhã, 2 de abril.
A liga divulgou recentemente os critérios de avaliação — os padrões que os juízes vão usar para realizar o julgamento. São eles:
5 Pilares da Pontuação
Comprometimento e Grau de Dificuldade: quanto mais crítica for a seção e mais ousada a manobra, maior o risco — e, potencialmente, a recompensa.
Manobras Inovadoras e Progressivas: esqueça o básico. O que conta aqui são os movimentos criativos, modernos e ousados.
Combinação de Manobras: não basta fazer uma boa manobra. O segredo é emendar uma atrás da outra com precisão, potência e fluidez.
Variedade de Manobras: mostrar que você domina diferentes estilos e técnicas é essencial. Cada nuance conta ponto.
Velocidade, Potência e Fluidez: é a espinha dorsal do julgamento. Manter o ritmo, controlar a prancha com autoridade e fazer as transições parecerem naturais é o que diferencia os grandes nomes.
Boletim Surf City El Salvador Pro
Atualizado em 1º de abril (Surfline Forecast)
🌊 Quarta (2/4): ondas boas (1,5m a 1,8m), com séries maiores nas maré cheia. Melhores condições pela manhã.
🌊 Quinta (3/4): swell contínuo, com tamanho semelhante. Mar um pouco mexido no fim da manhã.
🌊 Sexta (4/4): ondas diminuem levemente, mas ainda divertidas. Vento maral moderado à tarde.
🌊 Sábado (5/4): menor dia (0,9m a 1,2m), mas com séries surfáveis. Condições ok pela manhã.
Vale rever uma das baterias mais eletrizantes de 2024, com o eventual campeão do evento e campeão mundial John John Florence superando Yago Dora em um confronto de alto nível. Agora, Dora volta a El Salvador buscando vencer duas etapas seguidas do CT, após sua performance perfeita em Portugal.
Dança das cadeiras
Bryan Perez (El Salvador), Alyssa Spencer e Levi Slawson (EUA) foram confirmados como wildcards desta etapa. Spencer e Slawson são os surfistas mais bem colocados no ranking do Challenger Series (América do Norte). Já Perez cresceu surfando em Punta Roca.
Ian Gentil e Nadia Erostarbe entram como substitutos nos lugares de Gabriel Medina, lesionado, e Johanne Defay que está grávida. Com o afastamento de Tatiana, Kirra Pinkerton assume a vaga. Finalmente, que Ryan Callinan retorna de lesão.
CBSurf lança programa de notícias
O CBSurf News é o novo programa da Confederação Brasileira de Surf, transmitido no canal oficial do YouTube. A programação inclui notícias de eventos, quadros informativos e entrevistas com personalidades e atletas.
Na estreia, Teco Padaratz, presidente da confederação, anunciou que cada etapa do Dream Tour passará a ter R$ 500 mil em premiação. Confira a estreia.
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Janaina, tudo bem? Eu não acreditava em epifanias até que em 2012 eu li um livro chamado 'Devagar ou em defesa da lentidão' (título em inglês, que é melhor que o em português) do Carl Honoré. A partir daquele momento, baixei a velocidade, para tudo. E minha vida deu uma guinada interessante, muito positiva. Não resolveu meus problemas, mas aprendi a conviver com eles e com o mundo de uma forma melhor (especialmente depois de descobrir a meditação uns anos depois, mas sei que por causa daquela epifania). Vale a leitura. Abs!